Raro é o sonho... Aqui
Solto da guita que o manteve preso, por instantes, à minha mão, o pião rodopia, finalmente, sobre o chão de terra que a insistência dos passos dos Homens roubou ao jardim. A vida goza sempre de uma dupla face, e a monotonia que persiste na rotina da gente é capaz de inventar terreiros para podermos brincar. Ali mesmo ao lado, num canteiro desenhado pelo buxo, e aparentemente indiferentes ao pião, as rosas vermelhas discutem com as amarelas, atiçando-se mutuamente os espinhos; divagando sobre a magna importância do sangue ou do sol, que lhes dão cor, não se entendendo sobre qual tem o estatuto de mais nobre e imperial. Um pássaro que as sobrevoa baixinho sorri chilreando, enquanto uma borboleta de asas de papel se afasta lentamente para o retiro dos malmequeres, cansada de tamanha e fútil discussão. Eu baixo-me, apanho o pião que devolvo à guita e ao bolso, deitando-me de seguida no tufo de relva que me parece mais confortável, como quem encara o céu de frente e olhos nos