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A mostrar mensagens de junho, 2017

Pedrogão

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As árvores, que insistem morrer de pé, permanecem como guardiãs do silêncio que deixámos atrás de nós. Sim, nós partimos com a urze e os pássaros para a viagem dos poetas, dos Homens que se agarram ao sol e não o deixam fugir no fim de um sábado qualquer, preferindo puxar sobre sim o manto de um céu azul e permanente. Quando olharem a cinza que deixámos sobre os montes, não solucem jamais os nossos nomes, o fogo que se vê e se cola à pele, não incendeia e não queima a alma, apenas o outro, o fogo feito das chamas transparentes do amor, consegue fazê-lo, mas sempre para nascer e para poder voar. Nós somos a alma, e a alma permanece. Quando olharem as fontes, não as culpem de omissão no juízo de um qualquer tribunal, nós trouxemos o canto fresco das águas atado aos versos dos poetas, e sentimo-lo enquanto rasgamos o tempo batendo as asas. Não chorem por nós, e nem de saudade da urze, da copa verde das árvores e do canto dos pássaros. Se disso sentirem tentação, olhem o c

Capri

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Os traços são cúmplices das palavras, cumprindo o desígnio comum de pintores e escritores, no "desenhar" das suas muitas histórias e do eclodir da poesia. Henrique Pousão, pintor Português da segunda metade do Século XIX, é um dos meus favoritos, e o facto de ambos termos nascido em Vila Viçosa, terá por certo facilitado essa minha aproximação aos seus trabalhos, mormente uma série pintada nos anos que viveu na ilha de Capri, algures por 1882. Para mim, essa ilha Italiana próxima da costa de Nápoles, foi e será sempre a ilha de Pousão, e esta semana, visitando-a, levei na lembrança os quadros, indo em busca do artista. O barco entre Sorrento e Capri é muito veloz, deixando atrás de si uma estrada branca de espuma, que enfeita o mar no seu esplendor azul. Acerto o tempo retirando cento e trinta anos à velocidade do barco, para poder imaginar um homem magro, de chapéu de abas largas e calças de linho, a desembarcar num cais onde imperam pescadores e vendedores de limõe

Nós

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Nós, os Portugueses, somos poetas que negociamos com as gaivotas, trocando frutos maduros por lições da arte de bem voar. Sentados nas praias beijadas pela brisa salgada do fim da tarde, o nosso sonho projeta-se no oceano, como que abrindo as asas, e aquilo que de nós se vê nesse espelho imenso e azul, são corpos ao jeito de caravelas, cumprindo a vontade que se nos atou ao peito. Quando as gaivotas se entregarem finalmente às ameixas que cumprem a nossa parte do acordo, e que as esperam no areal, nós já estaremos muito longe dali, provando que é herói quem se deixa acontecer, seguindo pelo amor e pela liberdade, mesmo sabendo que na distância, e sozinhos, o tempo é sinónimo de saudade. Por muito querermos o céu, nós, os Portugueses, somos irmãos das gaivotas e de todos os pássaros do universo, e também somos poetas, por via da alma e do desejo. Nós jamais saberemos definir a fonteira entre um verso e um beijo.

Vou ter saudades suas

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Existia uma muralha de beijos entre mim e o medo, uma fortaleza transparente e gosto a caramelo, em cuja sombra brincava, alegre, colhendo palavras doces nos canteiros em forma de abraços, e olhando o céu muito azul, que sentia sempre tão demasiado perto. Ria-me muito e quase achava ridículo quando alguém me falava em envelhecer. Mas o tempo é o mestre que consegue vergar a nossa teimosia. Beijo a beijo, foi passando e fragilizando esta muralha, expondo-me ao medo e à ventania, ensinando-me também, e pouco a pouco, o que é a saudade e como ela dói. “Atão filho…”.  Era com estas palavras que o meu tio António recheava o beijo com que sempre nos saudávamos, e elas ecoaram em mim por entre mil memórias, enquanto o acompanhava na sua última subida ao castelo, em Vila Viçosa. A última viagem dos Calipolenses quando morrem. Sentimo-nos envelhecer quando os beijos se nos apagam assim, e o medo vai ficando tão próximo de nós. “O mê Quim”. Sinto-me tão mais pobre por entre este silê